Por que me saboto? Um olhar psicanalítico sobre essa resistência
- Jéssica Domingues
- 25 de jun.
- 3 min de leitura
Atualizado: 17 de nov.
Por que me saboto? Quando a resistência vem de dentro
Falta de força de vontade? Medo de dar certo? Baixa autoestima?
Essas são respostas comuns à pergunta: por que me saboto? Mas talvez em vez de buscar uma explicação imediata, possa-se questionar: o que o ato de se sabotar está tentando dizer?
Aquele e-mail que não foi enviado, a entrevista à qual se chegou atrasado, o projeto que nunca sai do papel: cada um desses gestos pode conter algo que resiste. Pode ser um modo inconsciente de preservar algo, evitar o contato com uma angústia maior ou manter uma posição subjetiva que, embora dolorosa, é conhecida.
A serviço de que está a resistência da autossabotagem?
Embora não sejam os únicos, vamos pensar em dois caminhos possíveis: impedir a realização de um desejo ou sustentar uma repetição dolorosa que ainda não foi possível encontrar uma outra via. O que está em jogo quando me aproximo de algo que desejo — e, ao mesmo tempo, crio obstáculos para alcançá-lo?
Freud, ao teorizar sobre compulsão a repetição e pulsão de morte em 1920, aponta que a psique tende a repetir situações dolorosas de um passado ainda presente. Há também o que ele chamou de "benefício secundário da doença": quando um sintoma, embora cause sofrimento, oferece algum ganho. Uma criança que adoece e recebe atenção redobrada pode ilustrar esse mecanismo (exemplo simples, mas elucidativo). No texto fracassados pelo êxito, de 1916, Freud também fala sobre algo que podemos chamar de autossabotagem em que ele associa com o sentimento de culpa - que pode ser inconsciente.
Repetimos, muitas vezes, formas de não realizar, mesmo quando essas formas nos fazem sofrer. Elas podem funcionar como defesas psíquicas contra angústias profundas, ou sustentar fantasias inconscientes sobre merecimento, punição, amor ou sucesso.

Na clínica, vemos que escutar essas repetições costuma ser mais potente do que tentar interrompê-las à força. A análise convida a contar e recontar essas histórias — e, nesse movimento, pode surgir a chance de elaborar e dar novo destino aos afetos implicados.
E então talvez em vez de se sabotar, seja possível se ajudar-se em seu proposito próprio.
Referências:
Freud, Sigmund (1916). Fracassados pelo êxito.
Freud, Sigmund (1920). Para além do principio de prazer .
Freud, Sigmund (1926). Inibição sintoma e angústia.
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Sobre a Autora:
Jéssica Domingues é psicanalista com percurso formativo pelo Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo. Atende adolescentes e adultos em consultório particular, com atendimento presencial em Higienópolis (São Paulo) e Cerâmica (São Caetano do Sul), além de atendimentos online. Participa de grupos de estudos voltados à psicanálise contemporânea. Interessa-se por temáticas como depressão, luto, repetição e as formas atuais de mal-estar. É autora do artigo “O conceito de limite em André Green como proposta anti-procustiana ao enquadre clássico”, apresentado na Jornada de Membros do Departamento Formação em Psicanálise do Instituto Sedes de 2022.
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