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Ansiedade e aceleração: sobre o ruído, o tempo e a ausência

  • Foto do escritor: Jéssica Domingues
    Jéssica Domingues
  • 28 de mai.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 17 de nov.

Ansiedade e aceleração: o apagamento da subjetividade


Vivemos tempos em que o ruído atravessa até aquilo que, por natureza, exigiria silêncio: o encontro, a escuta, a palavra trocada.


A aceleração cotidiana: quando a subjetividade se apaga


Semana passada, falávamos da flor que seguia o fluxo sem memória — e como não poder se repetir para elaborar implica em uma vivência dolorosa. De lá para cá, algo me deixou muito reflexiva. Em uma troca corriqueira de mensagens, percebi como a aceleração de um áudio gerou um ruído enorme, levando os envolvidos a um impasse de incompreensão.


Não é só sobre tecnologia: é sobre nossa relação com o tempo


Há algo mais profundo: uma dificuldade generalizada de sustentar a espera, a pausa, a nuance.


Conversando com outras pessoas, ouvi a frase: "mas ninguém ouve áudio no 1x mais". Não? E por que não? De onde vem essa pressa?


O mais assustador não é o episódio em si, mas o que ele revela: aquilo que é patológico está sendo normalizado, e aquilo que é humano — com seu tempo próprio, sua necessidade de elaboração — passa a ser visto como patológico.


"Para quê estou atrasada?" — uma intervenção inesperada


Lembro que, certa vez, na Avenida Paulista, anos atrás, eu estava correndo para entrar no metrô e um rapaz de uma ONG me abordou. Respondi: "Não posso, estou atrasada." Ele perguntou: "Para quê?" Ele não sabe, mas fez uma intervenção psicanalítica. Passei a me perguntar: para que estou atrasada? Pensei no que me fazia correr, para onde — e do que — eu fugia.


O mal-estar cultural e o culto à performance


O mal-estar de nossa cultura — como Freud já apontava — tem como um dos pilares o contato com o outro. O encontro inevitavelmente nos frustra, nos provoca, nos expõe à diferença e à perda. Mas hoje, parece que fugimos ainda mais desse mal-estar, substituindo o vínculo pelo automatismo, a presença pela performance.


Aceleramos até o momento do entretenimento, como se o próprio lazer precisasse ser otimizado. Ajustamos a velocidade da fala, do vídeo, da resposta — e, com isso, vamos perdendo nossa tolerância ao silêncio, à frustração, à própria experiência do tempo.


Percebem, por exemplo, como a duração dos filmes está cada vez mais curta?


A cadeia silenciosa do adoecimento


Essa aceleração cria um ambiente de baixa tolerância à variação, à frustração, ao sofrimento. Mas, sem capacidade de sofrer, não há capacidade de viver. Sofrer é poder suportar a espera, o vazio, a ausência, a não-imediaticidade.


Sem essa capacidade, resta apenas doer — e doer exige descarga imediata. Não há elaboração, apenas anestesia.


Esse é um efeito claro da ansiedade e aceleração: criamos, assim, uma cadeia silenciosa e contínua:

→ aceleramos para performar;

→ performamos para legitimar nossa existência;

→ e, no meio disso tudo, adoecemos — mas nem percebemos, porque o adoecimento já foi incorporado como norma.


A funcionalidade como anestesia: o que estamos deixando para o futuro?


Não surpreende que tantas práticas terapêuticas, alinhadas a esse funcionamento cultural, tenham como principal objetivo devolver às pessoas uma funcionalidade imediata — mesmo que à custa de uma subjetividade soterrada.


E me pergunto: ao priorizarmos essa funcionalidade anestesiada, desalmada, o que vivemos hoje? O que estamos deixando para o futuro?


Como sustentar o que há de vivo, pulsante e singular em nós, se seguimos apenas produzindo, entregando, desempenhando — e não mais partilhando, elaborando, convivendo?


Entre o ruído e a escuta: ainda há tempo?


Talvez, entre um ruído e outro, ainda possamos reaprender a escutar — não apenas ao outro, mas àquilo que, em nós, pede para ser vivido, e não apenas executado.


Quando não conseguimos sustentar o tempo da escuta, da pausa, da experiência, não apenas nos anestesiamos… mas, muitas vezes, nos tornamos violentos — com o outro, conosco. Sem espaço para elaboração, o que resta se expressa em reações abruptas, impacientes, por vezes agressivas. Será esse também um efeito desse funcionamento acelerado? Fica para uma próxima conversa.


E, se você está atrasado, eu te pergunto: para quê?


Ausência Carlos Drummond de Andrade Por muito tempo achei que a ausência é falta. E lastimava, ignorante, a falta. Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim. E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços, que rio e danço e invento exclamações alegres, porque a ausência, essa ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim.

Referências:


Continue lendo:


Ilustração em preto e branco de duas silhuetas humanas pontilhadas, fragmentadas, atravessadas por linhas irregulares que evocam ruídos e tensão. Texto: "Ansiedade e aceleração: sobre o ruído, o tempo e a ausência". Assinatura no canto inferior direito: Jéssica Domingues, Psicanálise.
Silhuetas fragmentadas, atravessadas por ruídos, ilustram a experiência contemporânea marcada pela aceleração e pela dificuldade de sustentar pausas, vínculos e a própria ausência.

Sobre a Autora:

Jéssica Domingues é psicanalista com percurso formativo pelo Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo. Atende adolescentes e adultos em consultório particular, com atendimento presencial em Higienópolis (São Paulo) e Cerâmica (São Caetano do Sul), além de atendimentos online. Participa de grupos de estudos voltados à psicanálise contemporânea. Interessa-se por temáticas como depressão, luto, repetição e as formas atuais de mal-estar. É autora do artigo “O conceito de limite em André Green como proposta anti-procustiana ao enquadre clássico”, apresentado na Jornada de Membros do Departamento Formação em Psicanálise do Instituto Sedes de 2022.


Se esse texto te deixou pensando, e quiser conversar sobre um possível início, você pode agendar uma sessão ou me escrever.

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